domingo, 25 de agosto de 2013

Carlos Lombardi estreia na Record depois de 31 anos na Globo

Carlos Lombardi, 54, adora praia, mas, "como bom paulista", acha areia "insuportável". "Não sei por que não botam um piso melhor."
Fez do seu gosto pessoal pelo sol e pelo mar a matéria-prima de sua obra na TV.
Autor de novelas das sete da Globo de alta voltagem cômica e sexual, como "Quatro por Quatro" (1994), não hesita em tirar a camisa (e outras peças do vestuário) de atores.
Os personagens descamisados de Lombardi retornarão à TV a partir da segunda quinzena de setembro em nova emissora e horário.
Após 31 anos na Globo, o autor foi para a Record, onde estreará "Pecado Mortal", às 22h30, sobre o momento em que os bicheiros perderam o poder nos morros cariocas para os traficantes, em 1970.
"Sei que fui, junto de 20 autores e outros profissionais, uma das pessoas que construiu o padrão Globo de qualidade. Mas não estou com a mínima vontade de virar uma história do passado, me interessa mais o presente", diz.
Lombardi não assina um um folhetim desde 2007. No período, teve duas sinopses rejeitadas na Globo -o remake de "O Rebu" (1974) e a inédita "João ao Cubo".
Em entrevista à Folha, fala do aumento do "esquadrão burocrático" dentro da Globo, sobre as demissões na Record e critica a rigidez da classificação indicativa, sob o governo do PT, que, segundo ele, tornou as novelas atuais "mais bobas do que há 10 ou 15 anos atrás". Leia trechos:
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Saída da Globo
Estava com pressa de fazer um projeto. E lá, o processo estava lento. Também queria mudar de registro. Fiz uma proposta maluca de uma comédia para as 19h, o "João ao Cubo". Seria o famoso clássico do cara com três mulheres, mas, em vez de três cidades, eram três épocas diferentes. Não sabia mais o que inventar. Não teve briga, não xinguei ninguém, estou muito velho para isso.
Classificação
As novelas hoje estão mais bobas do que há dez ou 15 anos atrás. A classificação indicativa ficou mais rígida, porque, quando o PT assumiu, essa parte ficou com a Igreja Católica. Escrever novela é lidar com a moral média do público. Se fizer uma história em que, no primeiro capítulo, a mocinha aborta, atravessa a rua e vai fazer sexo por prazer será controverso e o público não a apoiará.
Frequentemente, o Ministério Público está a reboque de gente mais careta que a média. Por medo do Ministério Público não vai ter cigarro em "Pecado Mortal". E ela se passa em 1977. Porque cigarro é droga legal e eles podem reclassificá-la por isso.
Estrutura da Record
Na Record, é menor a possibilidade de lidar com o imprevisto, com o improviso. Mas tem menos burocracia, porque há menos chefia. É impressionante como aumentou o esquadrão burocrático da Globo. Na Record, seu chefe está a duas portas.
Tentei logo de cara escalar a novela com o elenco da casa. Jussara Freire, Betty Lago, Paloma Duarte já estavam lá. É óbvio que seria bom ter o [Antonio] Fagundes. Mas passei 31 anos na Globo e nunca trabalhei com ele.
Karime Xavier/Folhapress
O autor Carlos Lombardi posa em seu apartamento, em SP
O autor Carlos Lombardi posa em seu apartamento, em SP
Demissões
O que a Record fez foi redimensionar sua equipe. Alguém convenceu [a direção do canal] de que dava para produzir três novelas com pouco dinheiro. O país está numa semi-recessão. O dólar disparou. Ninguém bota muita fé na administração econômica do governo. Os negócios estão parados. Na novela, tive que reduzir a quantidade de gravações externas. Em troca, ganhei um estúdio.
Audiência
Houve uma queda real e clara de audiência na Record. Não tenho a pretensão de virar o jogo com rapidez. Vou correr atrás. O objetivo é voltar a ser vice-líder nesse horário, mas a longo prazo.
Censura interna
Eu sei que é muito difícil falar de religião na Record, pelo fato de ter uma igreja associada à empresa. Então, não estou mexendo nisso.
Beijo gay virou a Atlântida, um mito. Todo mundo fala que vai fazer, mas nenhuma empresa aprova. Tem um personagem gay, um alfaiate, é bicha à moda antiga, disfarça, não quer que o bicheiro descubra. Ele vai virar a figura paterna de um garotão. Mas beijo gay, nem discuto. Tem muita gente na fila.
Descamisados
Os descamisados foram uma novidade nos anos 1980. Pergunta para o João Emanuel [Carneiro]. Naquele subúrbio de "Avenida Brasil" [Globo] ninguém usava camisa. Fiz isso como uma oposição à mexicanização. No Rio, as pessoas estão muito mais relaxadas, de chinelo. As mulheres usam shorts sim, elas não estão de tailleur. Todo mundo me copiou.
TV por assinatura
Meu contrato com a Record me libera para produzir para a TV paga. A qualidade média dessas novas séries brasileiras é baixa. Os textos, ruins. Não adianta ter um puta diretor se o roteiro não for bom. Pagam cenário, figurino, mas odeiam pagar autor. Não vou ter saúde para escrever novelas daqui a alguns anos. Não sei como Manoel Carlos [Globo] vai fazer uma nova, aos 80 anos. Torço para que esses seriados deem certo para que, daqui a uns anos, eu possa fazer também.

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